terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Jogadores ou julgadores?

Os jogadores consumam casos iluminatórios
Os julgadores consomem-se em ocasos eliminatórios
Os jogadores vestem tudo de festa
Os julgadores só vestem calça de festo
Os jogadores sentem com sentido
Os julgadores são ressentidos
Os jogadores dizem não ou sim
Os julgadores assim-assim ou nim
Os jogadores lutam por causas
Os julgadores defendem coisas
Os jogadores sonham
Os julgadores ressonam
Os jogadores levantam a taça
Os julgadores levantam-se com tosse
Os jogadores comem mel e ambrósia
Os julgadores bebem fel com Ambrósios
Os jogadores gozam com graça
Os julgadores gostam de Gaza
Os jogadores abrem e fecham bem os olhos
Os julgadores fecham e abrem mal os alhos
Os jogadores dão o rosto
Os julgadores dão restos e andam de rastos
Os jogadores arriscam a besta e até a bosta
Os julgadores petiscam o basta
Os jogadores embriagam-se com a partilha do vinho
Os julgadores brigam pela partilha da vinha
Os jogadores cobrem-se de luz
Os julgadores mascaram-se de luto
Os jogadores são animadores de circo
Os julgadores são animais de cerca

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

A vertigem das listas, de Umberto Eco


Finalmente, li este livro de listas. E senti algumas vertigens.
Primeiro, porque é uma lista de listas abertas ao infinito.
Segundo, pelas emoções causadas pela pintura, de que também acaba por ser um excelente catálogo, com peças, de corpo inteiro ou em fragmento, muito conhecidas, como o incontornável Jardim das delícias de Bosch, ou Campbell’s soup cans, de Warhol, mas também outras muito menos divulgadas, como é o caso de Tropismo, de Suzi Gablik, ou o Retrato do artista rodeado de máscaras, de James Ensor. Encantou-me o acto de rever, de apreciar com vagar, pormenores salientados pelo protagonismo duma página; fascinaram-me as novidades, dispostas ao serviço da estética da lista.
Depois, pela vontade — essa vertigem implacável — despertada de procurar os livros donde saíram algumas listas, como é o caso do Alexanderplatz de Alfred Döblin de Poésies de Lautrémont, dos de Jacques Prévert e dos de Szymborska.
Também porque saboreei as influências entre listadores, entre as quais as duas menos disfarçadas: as enumerações de gemas de Joris-Karl Huysmans e de Oscar Wilde; o tema do ubi sunt de François Villon e de Edgar Lee Masters.
E ainda porque senti — mais uma vez! — que o princípio da lista deve ser aplicado na aprendizagem. Porque aprendi muita coisa, listando palavras, regras, pequenas expressões, nos cadernos, na minha cabeça e porque é uma maneira simples de organizar a complexidade do real e do conhecimento, acredito na lista. Actualmente, vejo uma grande resistência a esta mnemotécnica, apesar de, insistentemente, a recomendar. Em breve, darei a experimentar aos meus alunos do Clube de Leitura/Escrita o prazer da lista, pedindo-lhes imitações das de estrutura mais palpável que aqui achei.
Agora, relendo a lista de títulos dos capítulos, confesso que sinto a vertigem da confusão. É que já não consigo assinalar-lhes as propriedades distintivas. Qual é a diferença entre o «excesso», a «enumeração caótica» e as «listas de coisas», por exemplo?
Mesmo com a visão turva desta última vertigem, caminho guiada por mais um livro de livros.